quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Retrospectiva


É, amigos... Esse ano não foi nada fácil.

A quarentena começou no dia do aniversário de 1 ano de Ravi. 17 de março. Cancelamos a festa, crentes de que em breve poderíamos celebrar... inocentes que somos.

Ficamos em isolamento por meses e meses. Do quarto para a sala, da sala para o quarto.

Celebrei meu aniversário por vídeo. Celebrei o de meu filho junto.

Celebramos os 90 anos de meu avô por vídeo. Toda a família falou com ele. Mal sabíamos que era uma despedida. Ele se foi alguns dias depois. Não pudemos fazer velório. Não pudemos ir ao enterro. A covid não permitia.

Ficamos angustiados, entediados... fiz da minha varanda quintal, piscina, jardim, cenário de mil aventuras para meu filho poder brincar um pouco. Tomamos banhos e banhos de bacia, lavamos chinelos, plantamos milho, houve arremesso de pedras, terra e cascalhos pelo chão. Infinitas vezes...

Ficamos tão exaustos emocionalmente que Ravi passou a me morder e me bater. Era muita frustração dentro de um corpo tão pequeno. E muita frustração em mim também.

Tivemos medo do vírus.

Tive contrato suspenso. Fui recontratada. Tive salário reduzido.

Engravidei. Me desesperei. Chorei. Sorri. Me emocionei. Fiz planos.

Fizemos exame de covid. Negativos. Fomos para Ilhéus. Um alívio na alma.

Ravi aprendeu a andar. Comeu muita laranja. Deu muito tchau ao caminhão de lixo. Varreu muitas folhas no quintal. Caiu de cara no chão e quebrou um dente.

Eu trabalhei, trabalhei, trabalhei MUITO. Anderson também.

Sofri com uma amamentação dolorosa enquanto Luna crescia na barriga. Aos poucos desmamei meu filho. Foi gentil e foi aliviante.

Fiz tantas orações para tantos parentes de tantas pessoas que estavam internados com covid. Vi amigos e parentes pegarem a doença. Ninguém dos meus ficou grave. Graças aos céus.

Voltamos para Salvador.

Passamos a sair um pouco. Um pouco de praia. Um pouco de praça. Um pouco de ar livre. A covid parecia estar diminuindo. A esperança se instalava.

Recebi um tio em casa. Os domingos à noite eram ótimos. Futebol e os três homens da casa animados. Até parecia que a vida estava normal. Mas o tio foi embora para a casa dele.

Fiz um chá de fraldas para Luna numa praça aberta. Pouca gente. Muito amor.

Recebi um casal de amigos. Muita comida vegana. Um ensaio de grávida dentro de casa. Ravi tinha outras pessoas para brincar. Foi bom. Houve eleições nesse meio tempo. Muita aglomeração. Trabalhei como nunca, até quase enlouquecer. Os amigos tiveram que ir embora também.

Então a covid se fortaleceu. Cresceu. E a esperança de dias melhores foi-se embora.

Preparamos a casa para receber vô, vó e tivó vindos de Ilhéus. De novo muita tensão. Não toquem em nada, não saiam do carro. Usem máscara.

Nosso gato adoeceu. Achamos que não era nada grave. Levamos ao veterinário. Era muito grave. E em poucos dias vimos nosso bichinho perder o brilho.

Celebramos o natal em casa apenas com nossos pais. Uma ceia gostosa. Nada de presentes, como havíamos combinado. Não queríamos ninguém indo a lojas. Todos obedeceram. Só Ravi ganhou uns mimos, porque vô e vó não resistem passar natal sem dar um presente pro neto.

E dois dias depois do natal, 2020 levou embora nosso Chico tão serelepe e cheio de vida. Ainda não me acostumei. Qualquer movimento no chão, ainda penso que é o meu bichano passando. Tive muita raiva de 2020 nesse momento. Era aniversário de minha irmã e não consegui celebrar como ela merecia. Foram 3 dias e 3 noites chorando. Agora eu sinto um vazio no peito. E tudo em casa me lembra Chico.

Os últimos dias do ano foram de barriga muito pesada. Todos os dias eu achei que era o dia em que Luna ia nascer. Pedi a ela todos os dias que esperasse chegar 2021. Ela me escutou.

Hoje é 31 de dezembro. Daqui a 5 horas, entraremos no novo ano.

Ainda estamos todos de máscara. Ainda deixamos sapatos lá fora. Ainda temos muito álcool em gel espalhado pela casa e no carro e nas bolsas. Ainda lavamos tudo o que entra na casa e tomamos banho depois de chegar da rua. E não sei como meu celular ainda não queimou com tanto spray de álcool.

Ainda somos governados por um imbecil e estamos assistindo de nossos sofás os outros países vacinando a população, enquanto não temos sequer seringas o suficiente, quem dirá um plano de vacinação.

Eu nem sei o que pensar de 2020. Às vezes parece um seriado. Foi tenso, muito tenso. Mais tenso do que feliz. E sinto culpa em reclamar, por causa dos meus privilégios.

Reconheço todos os meus privilégios. E ainda assim me compadeço com a dor dos outros. Com as perdas. Sinto medo. Sinto raiva do distanciamento e de tudo o que ele acarretou no desenvolvimento de nossas crianças. Sinto tristeza com a miséria de tantas famílias. Os privilégios não nos tornam menos humanos. E como humana, eu sinto muito.

Daqui a pouco diremos adeus a 2020. Queria que tudo de ruim que aconteceu nesse ano ficasse preso nele, como se um portal se fechasse e não permitisse a passagem para o ano que se inicia.

Adeus, 2020. Adeus, adeus, adeus. Vá embora!

Espero que em 2021 possamos voltar a viver de verdade, sem medo e sem máscaras.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Meu Deus... terei mais um filho!




Na última quinta, meu filho lindo completou 1 ano e 9 meses. Neste sábado, completei 9 meses de gestação (37 semanas). E eu confesso que tá meio difícil dessa ficha cair. Terei dois filhos. Dois. Dois bebês. Duas crianças. É isso mesmo, produção? Será que quando Luna nascer e eu segurá-la, essa compreensão de DOIS vai entrar em mim?

Das coisas que eu mais detesto ouvir nesse momento estão: “Coitadinho de Ravi! Vai sentir tanto!”... ou “Prepare-se! Ravi vai regredir!”... ou “Será que Ravi vai querer peito de novo?”...

People. EU SEI LÁ! Deixa Luna chegar. Deixa a coisa fluir. Meu filho é tão surpreendente em tantos aspectos. Quem sabe como ele reagirá? Pode ficar ciumento, chorão, grudento... pode ficar carinhoso, animado, interessado. Como prever? Não tem como. Eu só sei de uma coisa: Ravi sobreviverá. E com o tempo, ele e Luna construirão uma relação linda toda baseada em amor, porque se tem algo que eu quero fazer por meus filhos é ensiná-los a amar, respeitar, cooperar. E, acima de tudo, quero que sejam amigos, companheiros. Deixarei Ravi participar do que for possível. Banhos juntos, colo, carinho. Sei que haverá brigas, sei que haverá birras, sei que haverá choro. Mas tudo bem. Tudo faz parte do desenvolvimento dele. Estou aqui para acolher. O papai também.

O que me preocupa mesmo é... eu sobreviverei? Penso em todas as mães de dois filhos com idades próximas. Penso em como elas dormem, principalmente. Será que existe dormir no universo de dois filhos? Meu puerpério com Ravi foi tão tranquilo. Como será com Luna? Gostaria de estar descansando, mas ainda estou trabalhando (muito). Não tenho mala maternidade pronta. Não tenho ainda a poltrona de amamentação nova que comprei há mais de um mês. E, no meu caos pessoal, eu vivo cada dia tentando manter a sanidade, no meio dessa pandemia infernal que, não apenas nunca foi embora, como voltou a crescer poderosamente.

Queria fotos do meu parto. Queria avós babando a netinha na maternidade. Queria visitas trazendo carinho e afeto para conhecerem minha segundinha. Mas eu terei que me conformar com zero visitas, uma quarentena mais do que obrigatória e dar graças a Deus que estamos com saúde e a minha mãe e a minha tia estão vindo ser a minha rede de apoio (novamente! Obrigada!).

Ouço muita gente dizendo que 2020 foi transformador, que as fez crescer pessoalmente, e blá blá blá. Mas, na moral, achei 2020 o ó! Estar junto de meu marido e de Ravi em sua primeira infância foi bom, com certeza. Mas analisando o mundo, no geral, foram muitas perdas, quase 200 mil mortes no Brasil até esse momento e infinitas atrocidades políticas. Eu quero que esse ano termine e que o seu fim leve consigo tudo de terrível que aconteceu (incluindo, se possível, o presidente). 

Desejo do fundo do meu coração que a minha filha nasça em 2021, embora ela já esteja pronta para nascer a partir de agora. Quero um ano novo, uma vida nova, saúde para o nosso povo, vacina sendo distribuída, empatia, pessoas sendo empregadas, crianças voltando para a escola. Chega de doença. Quero ter dois filhos em um mundo em que pelo menos a gente possa se abraçar sem medo.

Terei mais um filho! Aliás... uma filha! Uma menina! E dessa vez em circunstâncias MUITO diversas em que tive o primeiro. E ela já nascerá num campo de batalha, onde cada ser humano precisa usar suas armas para se proteger, para sobreviver, para não prejudicar o próximo. Então, se já é pra nascer arregaçando as mangas, vamos nessa, Luna! A gente é forte, a gente fez um excelente trabalho até aqui e a nossa história está só começando.

Amor e paz, e um final de ano de muita fé, na esperança de dias melhores em 2021.

#Vem2021

#VemLuna

#ForaBolsonaro

quinta-feira, 1 de outubro de 2020

De todas as cores


Gestar, gerar, nutrir, sustentar... gestar é a coisa mais mágica que há. É verdade, é real... a gente lê, a gente escuta, mas a gente só entende mesmo quando está gestando. Ter um ser, um corpo, uma alma, um alguém se formando dentro de você e se nutrindo de você. É louco e é lindo. 

Quando descobri minha segunda gravidez, tive medo. Não foi planejado. Não era pra ser agora. Mas peraí... quem disse que não era pra ser? 

Eu chorando de espanto... marido rindo de felicidade... levantou do sofá e me abraçou. E eu senti o primeiro sinal de “está tudo bem”. Era o que eu mais precisava. 

Tive medo dos julgamentos. Engravidar na pandemia... de quarentena... com um filho pequeno para cuidar... Só o marido mesmo sabe a angústia que enfrentei. 

O julgamento veio... de quem eu mais sabia que viria, mas de quem eu menos precisava. Foi cruel, frio e duro. Foi triste, foi difícil. Foram meses de uma agonia no peito que não desejo a ninguém. Não era pra ser assim. O anúncio de uma gravidez NUNCA deveria ser recebido com frieza e dureza. Uma mulher grávida é um corpo num oceano de hormônios, nadando cachorrinho, tentando respirar, sentindo o peso da responsabilidade, do cansaço, do corpo... uma sensação de desamparo. Agora misture isso à uma pandemia, isolamento social, emprego incerto, reclusão. Fica aqui a minha dica: receba notícias de gravidez com alegria (exceto se for uma gravidez por causas criminosas ou indesejadas, óbvio). “Parabéns! Que notícia boa! Poxa, que alegria!” É tudo o que uma mulher precisa ouvir quando anuncia que está grávida. 

Outro dia, na aula online das crianças, aprendi a nomear um sentimento: “jumbled up”. É quando seus sentimentos estão todos misturados. A atividade era fofa. Cada criança deveria colorir 5 monstrinhos, e cada cor representava um sentimento: amarelo era alegria! Verde era calma. Azul era tristeza. E o monstro todo colorido estava “jumbled up”. Desde o início dessa gravidez me senti o monstro colorido. Saber nomear os sentimentos é um dos primeiros ensinamentos para o desenvolvimento emocional do ser humano. Mas só aprendi o “jumbled up” agora, sentindo na pele. 

A alegria de ser mãe de dois, misturada à angústia das circunstâncias atuais e ao medo do coronavírus, e também ao cansaço de cuidar do filho, da casa, dos trabalhos (graças a Deus os trabalhos sobreviveram)... a saudade das pessoas, não poder ir pra rua, e no meio disso tudo ficar muito feliz ao descobrir o sexo do bebê, e ter discussões homéricas com algumas pessoas próximas, se expor, se desnudar, se esconder, se resguardar...  

Então, veio mais uma ultrassom. Nessa, eu estava sozinha (como na primeira, já que o marido estava em casa cuidando de Ravi). E eu vi minha filha se mexendo, se virando, levantando os bracinhos... e no fim a médica disse: “Olha só essa boquinha!” e me mostrou aquela carinha na tela do aparelho. E ali uma ficha caiu, uma brecha se abriu em meu peito, o amor me inundou e uma lagriminha escorreu. Saí feliz do exame, desci o elevador, passei por corredores, paguei estacionamento, entrei no carro, passei um litro de álcool gel na mão e... desabei. Chorei, chorei, chorei como se não houvesse amanhã. Saí do estacionamento, cheguei em casa, parei o carro na garagem e lá fiquei, por mais uns 40 minutos e chorei tudo o que estava preso desde o primeiro dia. 

Ninguém nunca vai saber como é se sentir um monstro colorido até estar em uma situação extrema. Estar grávida, para mim, é extremo. Ali, eu abri meu peito e deixei extravasar toda a felicidade, a dor, a angústia, o medo, a alegria, o amor, o alívio... E tudo o que eu pensava era: estou gestando, estou nutrindo, estou gerando, estou sendo casa, abrigo, calor, alimento de um serumaninho que talvez tenha recebido algumas cargas de adrenalina nos últimos tempos e que talvez tenha também ficado “jumbled up” (me perdoa, filha, por não ter dançado e sorrido e cantado desde o começo como fiz com seu irmão). Mas ela está aqui, ela veio pra realizar o meu maior sonho que é ser mãe de dois, que é ver crianças brincando e brigando e correndo pela nossa casa. Que é ter uma família grande e completa e feliz e barulhenta e engraçada. Ela está vindo, ela está aqui dentro se colorindo de todos os sentimentos para nascer trazendo a luz e o amor dos quais o mundo anda tão carente nestes tempos sombrios.  

Ela virá. Logo mais. E vou recebê-la com todo o amor do mundo, para que ela nem tenha tempo de entender toda a confusão que está aqui fora, para que ela esqueça toda a confusão que está aqui dentro do meu coração. Para que ela apenas se sinta aninhada, aquecida, acolhida, amada, como seu irmão foi, é e sempre será. Serei mãe de dois. Terei um casal. Terei os dois braços preenchidos e todo o meu coração e todos os cantos da casa. Eu não poderia estar mais “jumbled up”, mas eu também não poderia estar mais realizada.  

Vem, minha Luna, que estou pronta pra ser Terra, aquecida por meu astrinho rei, meu Sol, meu Ravi, e agora fortalecida por minha Lua, meu símbolo de poder, feminilidade e renovação. Vem mostrar pro mundo sua força, minha menina! Estou te esperando, vermelhinha de amor!