terça-feira, 29 de julho de 2014

Qual é o limite para ajudar alguém?


Ajudar é uma coisa muito boa. Nos anos de escola, eu sempre tirava notas boas e logo ficava de férias. Muitos colegas que ficavam na recuperação me pediam ajuda para estudar. Eu não pensava duas vezes. Naquela época eu não analisava a situação, eu não pensava que, de certa forma, estava perdendo horas de descanso para estudar de novo tudo o que eu já sabia. Eu apenas pensava que tinha alguém precisando de ajuda, e o que se faz quando alguém precisa de ajuda? Você AJUDA, oras.

Há pouco tempo, descobri que basta dar um pontapé inicial numa campanha solidária que aparecem dezenas de mãos amigas para apoiar. Muita gente doa. Alguns doam muito, outros um pouquinho, alguns não têm nada material para doar, então eles “se” doam, colocam a mão na massa, carregam, arrumam, limpam, fazem o que tiver para fazer. Mas, de alguma forma, muita gente aparece, gente que, às vezes, eu nem imagino.

Todas as vezes que alguém ajuda, nasce uma coisa boa dentro de mim. Eu me emociono, de verdade. Tenho uma amiga que sempre pede segredo e me dá uma boa quantia em dinheiro. E todas as vezes, sem exceção, eu choro copiosamente. Não sei explicar o que é isso que eu sinto. Acho que é aquela emoção piegas de perceber que tem gente boa no mundo, que eu não estou sozinha nesse desejo de confortar os outros.

Um dia, o meu chefe, sabendo que eu tinha arrumado cestas básicas para os colegas da segurança da empresa (que não recebiam salário havia três meses) me chamou na sala dele:

- Como é que funcionam esses seus trabalhos solidários?
- Como funcionam? Eu sei que tem alguém precisando de ajuda, então lanço uma campanha e arrecado doações.
- E o que te motiva?
A pergunta me pegou de surpresa. Não é do perfil do meu chefe se interessar por nada em particular que eu faça e que não tenha sido uma ordem direta dele. Parei... pensei um pouco... Não achei nenhuma resposta inteligente e poética para dar e tudo o que consegui responder, foi:
- AJUDAR!
Então ele sorriu e me dispensou (É, eu sei... achei que ele iria puxar uma nota de cem reais da carteira e me entregar... mas ele não fez isso. Mas, para não ser injusta, devo dizer que ele já tinha ajudado com as cestas básicas.)

Enfim. O que eu quero dizer com isso é que eu não tenho um motivo que me faça querer ajudar. Eu apenas acho que é uma matemática muito óbvia. Alguém precisa de ajuda + eu tenho capacidade de ajudar = eu ajudo. Não significa, porém, que eu saia por aí distribuindo alegria para qualquer um que estenda a mão em minha frente. Sempre rola uma pesquisa para obter um mínimo de informações que me façam crer que a necessidade é real.

Acontece que hoje eu quis ajudar alguém. Uma pessoa só, que eu sei que precisa de ajuda. Eu já tinha colocado na cabeça que eu deveria ajudá-la calada, que não era para ninguém saber. Mas, por um lapso de consciência, e já prevendo uma resposta negativa, eu compartilhei o meu desejo com uma pessoa perguntando se ela gostaria de ajudar também, e ouvi um sonoro: “Eu, não!”, seguido de justificativas que, para mim, não são suficientes para me fazerem desistir.

Então eu parei um pouco para refletir: existe limite para ajudar alguém? Existe sim. Meus limites são claros. A pessoa PRECISA de ajuda? Sim? Pronto. O que essa pessoa fez no passado? O que ela anda fazendo ultimamente? Será que ela merece? Olha: devo dizer que não conheço a grande maioria das pessoas que eu ajudo. Se eu fosse fazer uma pesquisa da vida daquele senhor idoso lá no asilo, para saber se ele foi um péssimo pai no passado, e decidir se eu devo ou não dar-lhe um prato de comida, eu gastaria muito tempo, e o senhor morreria de fome.

Se eu conseguir as informações necessárias para decidir se o sujeito merece ou não a minha ajuda, assim o farei. Não sou a bondade personificada. Tenho meus termômetros. Mas se na minha balança os prós superarem de longe os contras, não me importam os pecados da pessoa. Eu farei o possível para ajudá-la. Lembro-me bem de uma palestra que fui no centro espírita (não, eu não sou espírita, eu apenas fui uma vez por curiosidade), quando perguntei se deveria ou não dar dinheiro para o mendigo na rua e a palestrante me respondeu: “Você deve agir como o seu coração mandar. Na hora, você vai olhar para a pessoa e o seu coração lhe dirá se você deve ajudá-la ou não”. E essa resposta guiou cada moedinha que eu doei (ou não) dali por diante.

Eu sei que tem muita gente com vontade de ajudar por aí. Estou rodeada delas e a benevolência brota de todos os lados quando há incentivo. Eu acredito muito fortemente que quem distribui o bem, recebe o bem. E ajudar é bom demais. Portanto eu vou continuar ajudando, independente de conhecer ou não as pessoas, de saber ou não de seus pecados. Eu continuarei ouvindo o meu coração que, até agora, tem acertado na mosca.

Aguenta aí, amigo. A ajuda vai chegar. De algum jeito, ela vai chegar.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

DNA do ouvir





Quando eu era pequena, sempre ouvia minha mãe dizer que as pessoas enxergavam em meu pai um bom ouvinte. Meu pai, sempre calado, discreto, era constantemente procurado por amigos para ouvir os seus desabafos. Lembro-me de um dia vê-lo sentado no sofá da sala, em silêncio, segurando o queixo com uma mão, enquanto um amigo contava um problemão de família. Eu não o ouvia dizer nada. Ele apenas escutava com atenção. Eu achava bonito. Até hoje é assim. Mesmo sem dizer nada, papai passa um ar de segurança que faz com que as pessoas venham até ele para derramar lamúrias. Eu acredito que é porque ele é, de verdade, um bom ouvinte. Não daqueles que apenas sentam lá e escutam o que você diz sem absorver nada. Ele te olha e parece compreender cada sentimento narrado.

Eu acho que nos meus genes vieram algumas partículas do DNA de ouvinte do meu pai. Vez ou outra, alguém me busca para contar algo. Pode ser um segredo, um problema, um acontecimento importante, uma dúvida, um conflito interno. O fato é que elas vêm e eu as escuto. Eu gosto de escutar. Há um tempo eu até era uma boa conselheira. Adorava falar sem parar, expondo as minhas opiniões e colocando-me no lugar do outro para elaborar soluções. Lembrei até de uma história. Eu tinha uma colega da faculdade que era uma romântica incurável, das que sonham com príncipes e cavalos brancos. Ela sofria muito com um amor mal resolvido e eu gastava todo o meu vocabulário em conselhos, falando com uma autoridade como se fosse um ás nos assuntos do coração. Hoje eu me pergunto: que experiência tinha eu para dar tantos conselhos? Acho graça!

Agora, prefiro me alimentar das palavras dos outros do que deixar as minhas escaparem. Fico igual a papai: sento, olho para a pessoa, e simplesmente dou a ela o meu tempo e a minha atenção. Dou mesmo, de presente. “Ei... tome algumas horas minhas e me deixa ouvir o que se passa nessa cachola.” Eu desenvolvi essa habilidade de ouvir e a aprimorei com o tempo, mas juro que foi involuntário. E eu venho percebendo que, com o passar do tempo, quanto mais escuto e menos falo, mais pessoas confiam em mim. Papai estava certíssimo. Nem todo mundo precisa de uma enxurrada de conselhos. Às vezes, alguém quer apenar expulsar a dor da alma, para ver se abranda, ou para ver se do lado de fora as palavras embaralhadas na cabeça fazem mais sentido. E nem sempre você tem a coisa certa para dizer naquele momento. Aí, o melhor mesmo é ficar em silêncio. O silêncio, nestas situações, pode ser um grande amigo. Quando não o silêncio, que sejam ditas palavras sinceras, mas com cuidado, com prudência. Porque às vezes, a verdade mal dita machuca, mas a mesma verdade dita com amor faz refletir e acalma o coração.

É preciso ouvir com atenção e dizer apenas o estritamente necessário...
... para ser mais amor.