segunda-feira, 28 de julho de 2014

DNA do ouvir





Quando eu era pequena, sempre ouvia minha mãe dizer que as pessoas enxergavam em meu pai um bom ouvinte. Meu pai, sempre calado, discreto, era constantemente procurado por amigos para ouvir os seus desabafos. Lembro-me de um dia vê-lo sentado no sofá da sala, em silêncio, segurando o queixo com uma mão, enquanto um amigo contava um problemão de família. Eu não o ouvia dizer nada. Ele apenas escutava com atenção. Eu achava bonito. Até hoje é assim. Mesmo sem dizer nada, papai passa um ar de segurança que faz com que as pessoas venham até ele para derramar lamúrias. Eu acredito que é porque ele é, de verdade, um bom ouvinte. Não daqueles que apenas sentam lá e escutam o que você diz sem absorver nada. Ele te olha e parece compreender cada sentimento narrado.

Eu acho que nos meus genes vieram algumas partículas do DNA de ouvinte do meu pai. Vez ou outra, alguém me busca para contar algo. Pode ser um segredo, um problema, um acontecimento importante, uma dúvida, um conflito interno. O fato é que elas vêm e eu as escuto. Eu gosto de escutar. Há um tempo eu até era uma boa conselheira. Adorava falar sem parar, expondo as minhas opiniões e colocando-me no lugar do outro para elaborar soluções. Lembrei até de uma história. Eu tinha uma colega da faculdade que era uma romântica incurável, das que sonham com príncipes e cavalos brancos. Ela sofria muito com um amor mal resolvido e eu gastava todo o meu vocabulário em conselhos, falando com uma autoridade como se fosse um ás nos assuntos do coração. Hoje eu me pergunto: que experiência tinha eu para dar tantos conselhos? Acho graça!

Agora, prefiro me alimentar das palavras dos outros do que deixar as minhas escaparem. Fico igual a papai: sento, olho para a pessoa, e simplesmente dou a ela o meu tempo e a minha atenção. Dou mesmo, de presente. “Ei... tome algumas horas minhas e me deixa ouvir o que se passa nessa cachola.” Eu desenvolvi essa habilidade de ouvir e a aprimorei com o tempo, mas juro que foi involuntário. E eu venho percebendo que, com o passar do tempo, quanto mais escuto e menos falo, mais pessoas confiam em mim. Papai estava certíssimo. Nem todo mundo precisa de uma enxurrada de conselhos. Às vezes, alguém quer apenar expulsar a dor da alma, para ver se abranda, ou para ver se do lado de fora as palavras embaralhadas na cabeça fazem mais sentido. E nem sempre você tem a coisa certa para dizer naquele momento. Aí, o melhor mesmo é ficar em silêncio. O silêncio, nestas situações, pode ser um grande amigo. Quando não o silêncio, que sejam ditas palavras sinceras, mas com cuidado, com prudência. Porque às vezes, a verdade mal dita machuca, mas a mesma verdade dita com amor faz refletir e acalma o coração.

É preciso ouvir com atenção e dizer apenas o estritamente necessário...
... para ser mais amor. 

5 comentários:

  1. Amei o Blog. Além do dom de ouvir você tem o de escrever. O título diz tudo: "Para ser mais amor". Você escreve com amor. Seus textos transmitem amor. Você é a essência do amor. Você é o amor. Siga em frente, meu orgulho. Papai.

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  2. Mais do que o texto de conteúdo precioso e estilo agradável de ler, o comentário do Papai foi lindo! <3

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  3. Pois é...E o que seria da minha vida sem o brilho do teu olhar, sem o afago dos teus ouvidos e do teu abraço, que às vezes dá vontade de ficar lá dentro e nunca mais sair dele... Pela lei natural de vida, seria eu quem teria que te acolher no colo com um sorriso iluminado exatamente como você faz comigo! É um orgulho ter você como sobrinha, como amiga, ouvinte, terapeuta e minha escritora predileta. VOCÊ É EXCEPCIONALMENTE INCRÍVEL! PARABÉNS PELA INICIATIVA DESSE LINDO BLOG! AMO-TE COM TODAS AS MINHAS FORÇAS, TERNURA E ETERNA GRATIDÃO! Tia Martinha

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